segunda-feira, 4 de novembro de 2013

RÉU NO PROCESSO DO MENSALÃO APRESENTA RECURSO SUSTENTANDO QUEBRA DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA NO JULGAMENTO

Por uma questão de isonomia, o raciocínio empregado para o caso do deputado José Borba — absolvido do crime de lavagem de dinheiro no processo do mensalão —deve ser o mesmo aplicado a João Paulo Cunha (foto) — condenado pelo mesmo motivo —, afirma o advogado Alberto Zacharias Toron, que defende João Paulo Cunha na Ação Penal 470, o processo do mensalão. Em recurso protocolado na última quarta-feira (30/10), Toron pede a absolvição de João Paulo Cunha do crime de lavagem de dinheiro e a revisão da perda automática de mandato.

O deputado foi condenado a nove anos e quatro meses de prisão pelos crimes de lavagem de dinheiro, corrupção e peculato. No crime de lavagem dinheiro, João Paulo Cunha recebeu, dos 11 votos dos ministros, 5 pela absolvição. Ele foi condenado a três anos de prisão. O deputado é acusado de receber R$ 50 mil para favorecer a agência de Marcos Valério em contrato com a Câmara dos Deputados.

Nos Embargos Infringentes, o advogado aponta a quebra do Princípio da Isonomia. Toron mostra o caso do deputado federal José Borba, denunciado por receber ter recebido R$ 200 mil da organização criminosa em troca de apoio político, que foi absolvido do crime de lavagem. Diferentemente do caso de João Paulo Cunha, ao julgar Borba, os ministros entenderam que o ato de receber o dinheiro configurava apenas corrupção passiva.

Para Toron houve desigualdade nos julgamentos. “Obviamente que os destaques e indagações feitos não pretendem reverter a justa absolvição do deputado Borba, mas podem e devem, pelas mesmíssimas razões, levar, igualmente, à absolvição de João Paulo Cunha, pois não há algo mais odioso que o tratamento desigual em situações de igualdade que vem condensado na clássica fórmula ‘dois pesos e duas medidas’”, diz Toron.

Ausência de denúncia

Nos Embargos Infringentes, o advogado afirma também que o deputado não poderia ser condenado por lavagem de dinheiro pois não foi denunciado por este crime. De acordo com o recurso apresentado, o Ministério Público Federal ao fazer a denúncia apontou a existência de uma quadrilha que se dividia em três núcleos: o político, o operacional e o financeiro — sendo este último onde ocorria lavagem de dinheiro. Entretanto, a denúncia em nenhum momento cita João Paulo Cunha como integrante da quadrilha.

“Não poderia voto condutor do acórdão e bem assim o voto que o acompanhou reconhecer fato não apontado na denúncia, consistente no procedimento previamente engendrado, do qual João Paulo Cunha não participou (por isso não foi denunciado na quadrilha) para lavrar a condenação por lavagem”, diz Toron no recurso.

Além disso, o advogado observa que o deputado não poderia ser condenado por lavagem simplemente por receber o dinheiro que passou pelo esquema apontado na denúncia. “O receber a vantagem por interposta pessoa representa a própria consumação do crime de corrupção e, portanto, um único comportamento típico, que não encontra espaço para a lavagem”, afirma.

Toron diz ainda que o deputado não tinha conhecimento do esquema. “Não tendo o deputado federal João Paulo Cunha participado de nenhum dos núcleos do mensalão, pode ele ser condenado por um processo do qual não tinha ciência?”, questiona.

Perda de mandato

O advogado contesta também a decisão do Supremo Tribunal Federal de que os parlamentares condenados criminalmente pela corte na Ação Penal 470 devem perder o mandato após o trânsito em julgado do processo. Toron cita que, em julgamento posterior, o Supremo decidiu em sentido contrário ao julgar a Ação Penal 565, que tratava do senador Ivo Cassol. Na ocasião, o STF decidiu que a perda do mandato dependeria de decisão do Senado.

“O Regime Constitucional vigente criou uma regra específica em relação à perda dos mandatos de Deputados e Senadores. Diga-se: nos casos de perda ou suspensão dos direitos políticos em geral, a perda do mandato se dá por declaração da Mesa (art. 15, CF c.c. art. 55, IV, §3º, CF); nos casos de condenação criminal, por deliberação do Plenário (CF, art. 55, §2º)”, diz a defesa.

Para Toron, o objetivo insculpido na Constituição é o de resguardar a separação de poderes, garantindo à casa legislativa o poder de decidir sobre a continuidade, ou não, do exercício do mandato de seus membros.

Clique aqui para ler os Embargos Infringentes.

José Dirceu

Organizações que perseguem a promoção de algum crime indeterminado, ou de um delito em geral, são classificadas como quadrilhas. Já associações construídas apenas para uma operação, concreta e pontual, não configuram formação de quadrilha, apenas coautoria, segundo o jurista argentino Jorge Federico Mikkelsen-Löth. Já Cezar Roberto Bittencourt aponta que não se pode confundir o concurso de pessoas, associação ocasional e temporária para cometer crimes determinados, com a formação de quadrilha, que é duradoura, permanente e tem como objetivo o cometimento indeterminado de crimes.

As citações dos dois juristas, feitas pelas ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia durante o julgamento da Ação Penal 470, o mensalão, no Supremo Tribunal Federal, embasam Embargos Infringentes apresentados pela defesa de José Dirceu. Os advogados José Luís Oliveira Lima, Rodrigo Dall’acqua e Jaqueline Furrier, do Oliveira Lima, Hungria, Dall’acqua e Furrier Advogados, pedem no recurso a absolvição do ex-ministro-chefe da Casa Civil pelo crime de formação de quadrilha, ou a redução da pena por tal crime.

A linha utilizada pelos advogados parte de trecho do voto de Cármen Lúcia, que absolveu Dirceu por entender que as provas não demonstram que o grupo tenha se associado de forma organizada, com estabilidade e permanência, para cometer crimes. Também é mencionada posição do revisor, ministro Ricardo Lewandowski, que atenta para o fato de o Ministério Público sempre apresentar denúncia por formação de quadrilha em crimes praticados por quatro ou mais pessoas.

É citado também trecho em que Lewandowski classifica como diferenciação entre o concurso de agentes e a formação de quadrilha “a indeterminação da prática de crimes na ação final”. Para o revisor, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Dias Toffoli, não houve a conjunção permanente com acordo subjetivo de vontades para praticar série indeterminada de crimes, o que afasta a possibilidade de formação de quadrilha. Na visão de Cármen Lúcia, a associação foi eventual, sem a estabilidade necessária para que a quadrilha fosse contextualizada, segundo o recurso.

Já Rosa Weber disse, de acordo com os embargos, que não houve dolo na criação ou participação dos réus em associação criminosa autônoma, sendo encontrado o dolo apenas na prática de crimes em série de peculato, gestão fraudulenta, corrupção e lavagem de capitais. Os advogados afirmam que a premissa da acusação era a chefia da quadrilha por parte de José Dirceu, mas é impossível apontar que os integrantes dos diversos núcleos se associaram para a prática de crimes indeterminados de forma estável, permanente e sob o comando de Dirceu.

A defesa também diz que a acusação imputou mais de 150 crimes aos integrantes do grupo criminoso, e o ex-ministro, apontado como chefe da quadrilha, foi condenado apenas por corrupção ativa em continuidade. O recurso aponta, então, a contradição de condenar por formação de quadrilha e indicar como comandante dos outros réus alguém cuja participação foi identificada em apenas um dos mais de 150 crimes que teriam sido cometidos pelo grupo.

Redução de pena

Caso seja mantida a condenação de José Dirceu por formação de quadrilha, a defesa pede a redução da pena, sob a alegação de que o cálculo conta com dois vícios. O primeiro foi o bis in idem na definição da participação e importância do ex-ministro no grupo, de acordo com os advogados. A pena foi elevada, aponta o recurso, tanto pelas “posições de mando e proeminência” no Partido dos Trabalhadores e no governo — “o signo de ‘palavra final’”, segundo o ministro Joaquim Barbosa — como pelo fato de Dirceu ter ocupado papel proeminente na condução das atividades de todos os réus.

Ao ser informado da situação, o relator da AP 470 teria dito que as práticas são diferentes, e os advogados questionam se realmente há diferença entre quem possui papel proeminente na condução das atividades de todos os réus e o “signo de ‘palavra final’”. A resposta da defesa do ex-ministro toma como base citação de Ricardo Lewandowski, para quem os argumentos são os mesmos.

O recurso ainda aponta a fixação desproporcional e contraditória da pena por formação de quadrilha, que varia de um a três anos de prisão, como previsto no artigo 288 do Código de Processo Penal. Os advogados citam novamente o ministro Lewandowski, pois ele classificou como desproporcional a fixação em dois anos e seis meses (75% do intervalo de variação possível) levando em conta que, para a corte, Dirceu “possuía metade das circunstâncias desfavoráveis”.

Os advogados também citam que Lewandowski e o ministro Marco Aurélio classificaram a fixação como desproporcional na comparação com a pena por corrupção ativa. Partindo das mesmas circunstâncias judiciais, aponta Marco Aurélio, a pena por formação de quadrilha foi majorada em 75%, enquanto a condenação por corrupção foi aumentada em 20%.

Clique aqui para ler os Embargos Infringentes apresentados pela defesa de José Dirceu.

Fonte: Conjur

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