sexta-feira, 29 de novembro de 2013

SUSTENTAÇÕES ORAIS NO STF DEMARCAM POSIÇÕES SOBRE IMPACTO DE PLANOS ECONÔMICOS

A primeira fase das sustentações orais no caso dos planos econômicos, no Supremo Tribunal Federal, foi marcada pelas alegações do governo e dos bancos de que os poupadores defendem um direito que não têm, e o representante dos poupadores afirmando que o governo e os bancos exageram suas contas para “assustar” os ministros. O julgamento, que começou nesta quarta-feira (27/11), será dividido em duas partes: a primeira, com a leitura dos relatórios e as sustentações orais, ainda em dezembro deste ano; e a segunda, com a leitura dos votos e o julgamento do mérito, a partir de fevereiro de 2014.

O caso discute a constitucionalidade da aplicação retroativa dos índices de correção da poupança a cadernetas já existentes na época dos planos. É que os planos econômicos (Bresser, Verão, Collor 1 e Collor 2) estabeleceram que as cadernetas de poupança seriam corrigidas por índices artificiais (cada plano estabelecia o seu), e não mais de acordo com a inflação registrada pelo IPC, como eram as poupanças contratadas antes dos planos. A reclamação dos poupadores é que os bancos aplicaram esses novos índices, e agora cobram a diferença.

Segundo os bancos, que se baseiam em dados do Ministério da Fazenda, se o Supremo decidir que os poupadores têm direito à diferença entre os índices de correção dos planos e a inflação registrada na época, o prejuízo será de R$ 140 bilhões. Mas os poupadores alegam, com base nos provisionamentos publicados nos balanços dos bancos, que o custo seria em torno de R$ 18 bilhões.

Durante as sustentações orais, as falas dos advogados dos bancos foi a de que os poupadores defendem um direito adquirido decorrente de ato jurídico perfeito improcedente. Isso porque os poupadores alegam que os contratos de poupança seriam os atos jurídicos perfeitos e a correção da poupança de acordo com a inflação seria o direito adquirido. Mas, de acordo com os bancos, o direito adquirido é a um índice de correção das cadernetas de poupança, e não ao índice que eles pleiteiam.

O primeiro a falar pelos bancos foi o advogado Arnoldo Wald, representando a Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif). Segundo ele, as mudanças nos índices de correção da poupança foram a medida encontrada pelo governo federal, na época, para acabar com a “inflação galopante”. “Como todos os demais membros da comunidade, os bancos participam dos resultados positivos e negativos da política monetária. Não obstante algumas discrepâncias que houve no passado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sedimentou, nos últimos 40 anos, que não existe direito adquirido a determinado direito econômico”, sustentou Wald.

Representando o Itaú, a advogada Claudia Politanski explicou que os planos econômicos foram a política do governo para manter a estabilidade dos contratos, inclusive os de poupança. “Os poupadores querem escolher índices mais altos, de acordo com a própria conveniência”, disse. Segundo ela, os poupadores que mantiveram suas cadernetas desde a época dos planos e nunca retiraram o dinheiro hoje terão, caso o STF reconheça o direito aos expurgos inflacionários, só de correção, uma quantia maior que o valor original.

O ministro aposentado do Supremo Eros Grau falou em nome do Banco do Brasil. Segundo ele, não existe direito adquirido a determinado índice, pois é o Estado quem o define. “Que direito adquirido seria esse? Certamente à correção monetária. Mas qual? A que viesse a ser definida pelo Estado. É necessário lembrar que todos esses contratos dos quais tratamos mencionaram simplesmente o direito do contratante à correção monetária. Qual? A fixada pelo Estado.” Também pelo Banco do Brasil, o advogado Antônio Pedro Machado completou: “Existem certas leis que não são aplicadas, mas não há lei sem aplicabilidade, e não é possível aplicabilidade sem força”.

Provisionamento

Representando os poupadores, o advogado Luiz Fernando Pereira defendeu que o discurso dos bancos inflou os valores discutidos para tentar sensibilizar os ministros. Ele citou os dados do Idec, que se baseou nos provisionamento dos bancos, e os baixou ainda mais. Disse que a Caixa é a única que discrimina em seus balanços quanto do provisionamento é referente aos expurgos de poupança, e diz que isso vai dar um terço do total. “Fazendo uma regra de três”, isso vai dar R$ 6 bilhões, segundo o advogado.

Ele também contestou o argumento de que os bancos não ganharam nada, já que, por lei, o dinheiro da poupança deve ser liberado para o Sistema Financeiro de Habitação. Portanto, dizem os bancos, não houve ganho para o sistema financeiro com a aplicação retroativa, porque os mutuários do SFH se beneficiaram dos índices dos planos.

Luiz Fernando Pereira, então, citou parecer do economista Roberto Troster, ex-economista-chefe da Federação Brasileiro de Bancos (Febraban), segundo o qual cerca de 50% dos ganhos das poupanças na época dos planos foram usados livremente pelos bancos. De acordo com Pereira, somente com o Plano Verão, isso resultou num faturamento de R$ 200 bilhões.

Depois, continuou o advogado, a Procuradoria-Geral da República fez um parecer próprio, com uma equipe técnica da própria PGR. Nesse parecer, disse, a conclusão foi de que, na época dos planos, faturaram R$ 441 bilhões.

Contestações

A explicação dada pelo Banco Central para o que seria uma falta de provisionamento, conforme alegado por Luiz Pereira, é que os bancos só provisionaram valores discutidos nas ações individuais. Como as ações coletivas estão paradas, os valores não constam dos balanços. Luiz Pereira, durante sua sustentação, brincou: “Para quem os bancos estão falando a verdade? Para a CVM [Comissão de Valores Mobiliários] ou para os ministros do Supremo?”

Representando o Santander, o advogado Marcos Cavalcante de Oliveira explicou que os provisionamentos são feitos com base em regras específicas definidas pelo BC e de acordo com “o juízo de probabilidade das circunstâncias fáticas”.

O professor Arnoldo Wald disse, ao fim do julgamento, que o argumento do provisionamento “não tem nada a ver com a realidade”. Segundo ele, as diferenças de provisionamento de um banco para outro são subjetivas e têm a ver com o acúmulo dos prejuízos e com as regras de cada um.

OAB

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil representará os poupadores durante o julgamento desta quarta-feira (27/11) no Supremo Tribunal Federal. Em pauta estão os processos que tratam de expurgos inflacionários em cadernetas de poupança decorrentes dos planos econômicos dos anos 80 e 90. A decisão da OAB de sustentar na tribuna foi tomada à unanimidade pelo Pleno do Conselho Federal na terça-feira (26/11).

A Ordem dos Advogados do Brasil está como amicus curiae no caso. Com a decisão, a autarquia reafirma posicionamento adotado na época em que o advogado Cezar Britto era presidente do Conselho Federal. O que estava definido para esta quarta era que a sustentação oral não seria feita pelo presidente do Conselho, Marcus Vinícius Furtado Coêlho, mas pelo vice-presidente, Claudio Lamachia, ou pelo secretário-geral, Claudio Pereira. Mas na manhã desta quarta, Marcus Vinícius decidiu conciliar os compromissos do dia com sua tarefa na tribuna. 

A discussão é bastante complexa. Envolve o fato de os planos econômicos, editados pelo governo na forma de medidas provisórias depois convertidas em lei, fixaram índices de correção das cadernetas de poupança abaixo da inflação registrada pelo IPC. Eram medidas de congelar a hiperinflação que marcou a história do Brasil na época.

Os poupadores reclamam que, ao aplicar as taxas de correção dos planos às cadernetas já existentes (e que eram corrigidas pelo IPC), os bancos violaram seu direito adquirido de ver seu dinheiro render de acordo com a alta de preços. Já os bancos alegam que os planos foram editados sob a forma de lei e regulamentados pelo Banco Central. Não lhes cabia outra opção que não seguir. E o governo federal defende que não há direito adquirido a correção monetária, e que o Supremo já declarou os planos econômicos constitucionais.

A situação em que se encontra o caso não é menos complexa. Na perspectiva favorável ao poupador está uma série de decisões anteriores dos tribunais. Na desfavorável, cresce a compreensão de que todos os brasileiros foram afetados igualmente pelos planos, mas eventual vitória beneficiará apenas quem acionou a Justiça. Ou seja, como na ponta do processo quem arcará com o reembolso será o próprio contribuinte, quem não foi à Justiça será prejudicado duas vezes. Os mutuários que não tiveram prestações reajustadas também podem ter que pagar a diferença.

O governo vem defendendo os bancos, já que eles fizeram o que foram ordenados a fazer: aplicaram os índices de correção estabelecidos pelos planos. Os valores envolvidos no caso são vultosos. Os bancos, baseados em cálculos do Ministério da Fazenda, dizem que, se perderem, terão de desembolsar R$ 150 bilhões. O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), que defende os poupadores na qualidade de amicus curiae, tem contas que variam de R$ 18 bilhões a R$ 8,2 bilhões. E este número também é alegado pelos poupadores, nos autos representados pelo advogado Luiz Fernando Pereira.

 Fonte: Conjur

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