sexta-feira, 29 de novembro de 2013

STF JULGARÁ PROCESSOS SOBRE PLANOS ECONÔMICOS COM QUÓRUM MÍNIMO

Com os impedimentos de ministros do Supremo Tribunal Federal, o julgamento dos expurgos inflacionários em cadernetas de poupança decorrentes dos planos econômicos dos anos 80 e 90 será feito com apenas oito julgadores. Os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e Luis Roberto Barroso estão impedidos de participar do julgamento, que definirá se os bancos poderiam ou não retroagir os índices de correção da poupança menores que a inflação definidos pelos planos.

A discussão é bastante complexa. Envolve o fato de os planos econômicos, editados pelo governo na forma de medidas provisórias depois convertidas em lei, fixaram índices de correção das cadernetas de poupança abaixo da inflação registrada pelo IPC. Eram medidas de congelar a hiperinflação que marcou a história do Brasil na época.

Os poupadores reclamam que, ao aplicar as taxas de correção dos planos às cadernetas já existentes (e que eram corrigidas pelo IPC), os bancos violaram seu direito adquirido de ver seu dinheiro render de acordo com a alta de preços. Já os bancos alegam que os planos foram editados sob a forma de lei e regulamentados pelo Banco Central. Não lhes cabia outra opção que não seguir. E o governo federal defende que não há direito adquirido a correção monetária, e que o Supremo já declarou os planos econômicos constitucionais.

Na tarde desta quinta-feira (28/11), o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, indeferiu as arguições de impedimento dos ministros Luiz Fux, Gilmar Mendes e Dias Toffoli feitas pela Associação dos Poupadores de Caderneta de Poupança e Assistência a Vítimas de Acidentes de Trânsito (Procopar). No entanto, Fux já havia se declarado impedido porque tem uma filha que trabalha no escritório do advogado Sergio Bermudes, que defende os bancos no caso.

A novidade é a ministra Cármen Lúcia, que confirmou seu impedimento nesta quinta. Diz-se que o pai dela era dono de caderneta de poupança na época em que os planos foram editados. Portanto, se o STF reconhecer a existência de expurgos inflacionários decorrentes dessa aplicação retroativa dos índices abaixo da inflação, o pai da ministra Cármen será um dos que terá direito a receber as correções. Como o pai de Cármen já morreu, esse dinheiro ficaria de herança. No entanto, a ministra não pôde ser contatada para confirmar a informação.

O ministro Luis Roberto Barroso se declarou impedido porque deu parecer no caso quando era advogado. Em seu texto, foi contra o direito dos poupadores a receber os expurgos inflacionários.

Com isso, o Pleno do STF ficou com o quórum mínimo para decidir a questão. Por lei, o tribunal deve ter em Plenário oito ministros para debater questões constitucionais. E o resultado só pode ser proclamado se houver seis votos em determinado sentido.

Sustentação Oral da AGU

A nova rodada de sustentações orais no Supremo Tribunal Federal, no caso dos expurgos inflacionários em cadernetas de poupança decorrentes dos planos econômicos dos anos 80 e 90, reiterou a briga de opiniões sobre se o sistema vai quebrar ou não. Nesta quinta-feira (28/11) foram feitas as sustentações orais dos amici curiae no caso, encerrando a etapa de manifestações dos terceiros interessados. O único que falta se pronunciar antes do início do julgamento é o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Em discussão está o fato de os planos econômicos, editados pelo governo na forma de medidas provisórias depois convertidas em lei, fixaram índices de correção das cadernetas de poupança abaixo da inflação registrada pelo IPC. Eram medidas de congelar a hiperinflação que marcou a história do Brasil na época.

Os poupadores reclamam que, ao aplicar as taxas de correção dos planos às cadernetas já existentes (e que eram corrigidas pelo IPC), os bancos violaram seu direito adquirido de ver seu dinheiro render de acordo com a alta de preços. Já os bancos alegam que os planos foram editados sob a forma de lei e regulamentados pelo Banco Central. Não lhes cabia outra opção que não seguir. E o governo federal defende que não há direito adquirido a correção monetária, e que o Supremo já declarou os planos econômicos constitucionais.

Em nome da União, o advogado-geral da União, Luis Inácio Adams, foi á tribuna dizer aos ministros que, caso o tribunal entenda que a retroação do índice foi inconstitucional, o contribuinte é que vai arcar com as consequências. Isso porque a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil, segundo as contas do Ministério da Fazenda, representam quase 70% das cadernetas de poupança envolvidas na discussão.

Para Adams, o argumento de que a retroação dos índices é inconstitucional é, na verdade, alegar que um contrato pode estabelecer a vigência ou não de uma moeda. “O tema aqui é garantir o poder-dever do Estado de intervir e garantir o valor da sua moeda e garantir a estabilidade econômica”, sustentou o AGU. “Se é possível contratualizar contra esse poder-dever, está eliminada a soberania do Estado na determinação de sua moeda.”

Depois do fim da sessão, Adams explicou a jornalistas que a moeda tem aplicação imediata, e o cálculo da correção monetária faz parte dessa aplicação. “A moeda nova expurga a inflação antiga”, disse. O que os poupadores pedem, para ele, é que o Supremo estabeleça de volta os velhos índices inflacionários.

Combate à inflação

O procurador-chefe do Banco Central, Isaac Sidney Menezes Ferreira, completou a fala de Adams. Em sua sustentação na tribuna, afirmou que o pedido dos poupadores é o de que o STF tolere a existência de índices de correção monetária diferentes simultaneamente. Mas os planos econômicos, segundo ele, foram editados para combater a inflação.

“E esse combate não é possível sem interferir, de imediato, nos contratos em curso, para adaptá-los à nova realidade sem inflação”, resumiu. Se o Supremo afirmar que os poupadores têm direito aos expurgos, segundo o procurador do BC, “não se terá inaugurado uma nova era monetária e seus efeitos, porque inconstitucional é a inflação, não os planos econômicos”.

Granada oca

O advogado Oswaldo Pinheiro Ribeiro Junior, que representou a Ordem dos Advogados do Brasil, defendeu os poupadores. Disse que o reconhecimento do direito aos expurgos significa reconhecer a estabilidade dos contratos, e dar procedência aos pedidos dos bancos, consequentemente, significa o descumprimento do que fora pactuado. “Isso passaria ao mundo a mensagem de que no Brasil os contratos podem ser quebrados.”

Já o advogado Walter Moura, que falou em nome do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), questionou o que chamou de “estratagema processual dos bancos”. Segundo ele, os banco lançaram uma série de “granadas ocas”, que nunca vão explodir, mas que serviram de ameaça.

Ele se refere ao impacto de R$ 150 bilhões na economia nacional caso o Supremo dê ganho de causa aos poupadores. O valor alegado pelos bancos e pelo BC. Moura afirma que a conta feita pelos bancos é irreal, porque nem todos os poupadores ingressaram em juiz e, mesmo que ingressassem, as sentenças favoráveis não seriam executadas de uma só vez.

Walter Moura citou o caso do Banco Real, comprado pelo banco holandês ABN Amro em 1998 e depois vendido ao Santander em 2007. “Será que durante essas compras não foram feitas auditorias de quanto o banco teria de pagar com as cadernetas de poupança?”, ironizou.

Teses questionáveis

Editorial da Folha de São Paulo

A definição virá, se enfim vier, apenas no ano que vem. Mas ao menos o plenário do Supremo Tribunal Federal começou a analisar ações sobre a correção da poupança em quatro planos de estabilização da economia, de 1987 a 1991 (Bresser, Verão, Collor 1 e Collor 2).

Na prática, estão em jogo processos de cerca de 400 mil poupadores que alegam ter perdido dinheiro com as mudanças nas regras de correção dos saldos; os bancos teriam, de forma inapropriada, embolsado a diferença entre a reposição devida e a efetuada.

São teses questionáveis, para dizer o mínimo. Implementados pelo governo — e não pelo sistema financeiro —, os planos econômicos pretendiam interromper o exasperante ciclo de reajuste de preços.

Adequou-se, nesse intuito, a correção monetária à brusca redução da inflação, preservando o poder de compra e o equilíbrio dos contratos. Sem isso, os poupadores (todos os credores, na verdade) seriam remunerados de acordo com taxas anteriores aos planos, muito superiores ao novo padrão inflacionário. Teriam ganhos repentinos e indevidos — difícil chamar isso de direito adquirido.

Os bancos, por sua vez, foram (e são) obrigados por lei a repassar 65% daqueles valores ao financiamento da casa própria. Ou seja, ainda que tivesse havido correção menor do que a devida, a maior parte desse "lucro" teria sido dividida com os mutuários, beneficiados por dívida também menor. Serão chamados a pagar a diferença?

De resto, como os bancos somente seguiram diretrizes oficiais, será natural que, caso percam a ação, tentem repassar a fatura ao governo federal. Impactos negativos nas contas públicas, já cambaleantes, teriam efeitos em toda a sociedade, na forma de mais impostos ou serviços públicos ainda piores.

Nem é essa, a rigor, a consequência mais sombria. Estima-se que as indenizações, somadas, possam chegar a R$ 150 bilhões. O montante equivale a cerca de 50% do patrimônio dos cinco maiores bancos do país (Banco do Brasil, Caixa, Bradesco, Itaú e Santander). Uma erosão de tal monta do capital bancário provocaria colapso de crédito e tumulto financeiro.

Verdade que, pelos cálculos do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), as perdas do sistema bancário seriam mais singelas, da ordem de R$ 18 bilhões. Seria inegavelmente menor, mas ainda assim relevante, a ameaça a ser suportada por toda a sociedade; não estariam superadas, no entanto, as objeções de fundo.

Em qualquer caso, a própria disparidade entre os valores é mais um testemunho da insegurança que prevalece nesse caso. Passou da hora de o Supremo Tribunal Federal encerrar a controvérsia, com uma decisão que não traga instabilidade ao país mais de 20 anos depois.

Fonte: Conjur

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