quarta-feira, 12 de junho de 2013

TURMA DO TST DECLARA SUSPEIÇÃO E RECURSO DA EMPRESA AÉREA VASP SERÁ REDISTRIBUÍDO

Se ainda não receberam o que pleiteiam, os ex-empregados da falida companhia aérea Vasp já podem comemorar pelo menos uma vitória improvável na Justiça Trabalho. Depois de dois anos, a defesa do Sindicato dos Aeroviários do Estado de São Paulo conseguiu que toda uma Turma do Tribunal Superior do Trabalho se declarasse suspeita para julgar um recurso do ex-dono da companhia, o empresário Wagner Canhedo.

Ao contestar uma decisão incomum dos ministros da 5ª Turma do TST, os trabalhadores entraram com uma Exceção de Suspeição contra todos eles, alegando favorecimento ao empresário. Depois de dois anos e reviravoltas no processo, deu certo.

Os ministros João Batista Brito Pereira e Emmanoel Pereira, que haviam decidido a favor de Canhedo, declararam-se suspeitos, segundo despacho publicado sexta-feira (7/6) pelo TST. A ministra Kátia Arruda, logo após o protesto dos ex-funcionários, em 2011, pediu transferência para a 6ª Turma. O ministro Caputo Bastos, que só entrou na 5ª Turma depois do imbróglio, estava impedido devido à atuação de um parente em um processo conexo. Com essa situação, o processo será redistribuído pela Presidência do TST a outra Turma.

A batalha se deu em torno da adjudicação — meio pelo qual o credor aceita um bem do devedor, sem leilão —  da Fazenda Piratininga, do grupo Canhedo, para o pagamento de parte da dívida de R$ 1 bilhão com os trabalhadores depois da falência da Vasp. Adjudicada pelo sindicato, a fazenda e os ativos que nela estavam foram vendidos por R$ 310 milhões para sócios do grupo Hypermarcas.

A operação foi contestada por Canhedo e a briga chegou ao Superior Tribunal de Justiça, que declarou a venda como definitiva. Em junho de 2011, no entanto, a 5ª Turma do TST admitiu um Agravo de Instrumento da Agropecuária Vale do Araguaia, dona da Fazenda Piratininga em São Miguel do Araguaia (GO) e integrante do grupo Canhedo, convertendo o instrumento admitido em Recurso de Revista, com poder de mudar todo o quadro e declarar a adjudicação nula.

Segundo o advogado Francisco Gonçalves Martins, um dos defensores dos Sindicatos dos Aeroviários e dos Aeronautas, a decisão contrariou jurisprudência da corte e decisões que os próprios integrantes da 5ª Turma haviam dado antes e depois do caso Canhedo.

Até mesmo em apelo anterior do próprio empresário, os ministros rejeitaram igual alegação. Seguindo a Súmula 164 da corte, os ministros, por maioria, entenderam que não existe a possibilidade de subida de Recurso de Revista sem a procuração dada ao advogado que representa a parte. Ao pedir a subida do recurso ainda na segunda instância, a agropecuária não havia juntado a procuração.

Mas depois que dois ex-ministros do TST assumiram a defesa do caso — Luiz José Guimarães Falcão e Francisco Fausto Paula de Medeiros, ex-presidentes da corte e hoje advogados —, a opinião dos integrantes da 5ª Turma mudou.

Os membros do colegiado aceitaram os Embargos e entenderam que a exigência prevista na súmula era contornável. “Dou a mão à palmatória se alguém encontrar decisão como essa nos últimos 15 anos”, desafiou Martins na época, em entrevista à ConJur em 27 de julho de 2011.

“Fica claro que no Brasil nós temos dois Direitos: um para proteger Canhedo, ainda que à margem do Congresso Nacional e da jurisprudência consolidada, e outro, emanado do Poder Legislativo, ao qual todos, exceto Canhedo, submetem-se", disse o advogado.

Em nota enviada à ConJur por meio de sua assessoria de imprensa, o TST afirmou, na ocasião, que a decisão se baseou na jurisprudência do Tribunal sobre o tema. “Todas as vezes nas quais o Judiciário é acionado, já que age mediante provocação, suas decisões são motivadas. Caso a parte não se sinta contemplada em sua pretensão, há meios próprios de tentar reverter sua situação”.

Francisco Martins ajuizou a Exceção de Suspeição contra os ministros em julho de 2011. Em março do ano passado, o Órgão Especial do TST, por uma questão de prazo, não conheceu do incidente e não o julgou, o que liberaria a 5ª Turma para decidir o já aceito Agravo de Instrumento transformado em Recurso de Revista. Mas, desde então, o caso estava parado. Na (6/6), porém, o presidente do tribunal, ministro Carlos Alberto Reis de Paula, publicou despacho determinando a redistribuição do recurso.

“Depois da referida decisão, os ministros João Batista Brito Pereira, Emmanoel Pereira e Caputo Bastos (que passou a integrar a 5ª Turma no curso do incidente de suspeição) declararam-se suspeitos por motivo íntimo, nos termos do artigo 135, parágrafo único, do CPC. Após, o processo foi encaminhado à Presidência do TST”, explica o despacho. “Em face da suspeição declarada por todos os ministros integrantes da 5ª Turma desta Corte, determino que se proceda à redistribuição do feito no âmbito de uma das demais Turmas desta Corte para que prossiga no julgamento do feito como entender de direito.”

Para o advogado dos trabalhadores, a mudança só aconteceu por causa da divulgação dos fatos. "O tal foro íntimo só aconteceu, da parte de tais ministros, por conta da matéria publicada na ConJur no dia 27 de julho de 2011, dentre outras. Fica claro que a imprensa tem um papel decisivo no modus operandi dos órgãos do Poder, na medida em que retira as coisas das trevas e põe à luz do dia", declarou Francisco Martins.

Jurisprudência flex

A história começou quando o sindicato afirmou que o advogado de Canhedo, Carlos Campanhã, ajuizou recurso sem juntar procuração, admitido pelo Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo. O TRT aceitou um Recurso de Apelação contra a adjudicação da fazenda, sendo que a via correta de contestação seria o Agravo de Petição. Apesar do recebimento, o recurso foi negado no mérito.

Contra essa decisão, a Agropecuária Vale do Araguaia ajuizou Recurso de Revista dirigido ao TST, que também foi negado. Seguiu-se um Agravo de Instrumento também dirigido ao TST, dessa vez negado pela 5ª Turma, justamente pela falta de procuração no Recurso de Revista. 

No entanto, ao julgar o Agravo de Instrumento, o ministro Brito Pereira pediu vista dos autos antes que a ministra Kátia Arruda votasse — logo após o relator do caso, ministro Emmanoel Pereira, rejeitar o recurso. “Antes do início do julgamento, as filmagens da sessão registram ostensiva demonstração de afeto entre o senhor ministro e o advogado da agropecuária”, disse Martins na Exceção de Suspeição. Em voto-vista, o ministro foi favorável à agropecuária, o que o advogado dos aeronautas aponta como suspeito, já que em outros julgamentos, anteriores e posteriores, o ministro não tolerou a falta de procuração.

Em seu voto, Brito Pereira afirmou que não se pode exigir da parte a juntada de procuração no caso de Agravo de Instrumento. “Não pode o julgador criar óbice à apreciação do recurso que não esteja previsto em lei, sob pena de sonegação da jurisdição”, disse. “Não prevalece o entendimento (…) no sentido da inexistência do Recurso de Revista, por irregularidade de representação, uma vez que é vedado ao julgador negar a prestação jurisdicional, por atribuir à parte o ônus pela remessa das peças necessárias ao exame de Agravo de Petição, em autos apartados, quando inexistente determinação em lei nesse sentido.”

Porém, em dezembro, ao julgar questão semelhante, o ministro defendeu a necessidade da procuração. “O ilustre advogado que subscreve digitalmente o Recurso de Revista (…) não detém poderes para representar a recorrente, pois não mais possui procuração válida nos autos”, afirmou em voto nos Agravos de Instrumento em Recurso de Revista 50740-65.2005.5.02.0014. “Ante a irregularidade de representação verificada, não admito o recurso, porque inexistente no mundo jurídico (Súmula 164/TST).”

“O senhor ministro não fez qualquer ressalva em seu voto-vista de que teria mudado de entendimento sobre a validade acerca da imprescindibilidade de juntada de mandato de advogado que assina recurso de revista”, protestou Martins.

Segundo o advogado, a decisão nos Embargos permitiu que o processo fosse convertido em Recurso de Revista pelos ministros, mesmo contrariando decisões dos mesmos julgadores anteriores e posteriores ao julgamento. “Compulsando a jurisprudência — 2.700 acórdãos — da 1ª, 2ª, 3ª, 4ª, 5ª, 6ª, 7ª e 8ª Turmas do colendo Tribunal Superior do Trabalho (…), não se encontra, in pari materia, vale dizer, ausência de procuração do advogado que assinou o Recurso de Revista, nada igual ao quanto decidido em 29 de junho de 2011 pelos senhores ministros da 5ª Turma”, afirmou.

Martins colaciona decisões dos ministros contrárias à que foi tomada nos Embargos de Canhedo. De Emmanoel Pereira, cita, entre outros, o AIRR 152742-75.2004.5.15.0115, julgado em maio de 2010, o Recurso Ordinário em Ação Rescisória 350200-42.2007.5.01.0000, julgado em agosto do mesmo ano, e o AIRR 8245-02.2010.5.01.0000, julgado em junho de 2011. De Kátia Arruda, menciona o AIRR 152241-24.2004.5.15.0115, julgado em junho de 2011. Em todos os casos citados, os ministros reafirmam a necessidade da procuração para interposição de Recurso de Revista.

Clique aqui para ler a Exceção de Suspeição.
Clique aqui para ler os Embargos de Declaração da agropecuária.

Fonte: Conjur

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